Ao proferir na segunda-feira (07/11) palestra sobre “Os desafios do sistema eleitoral brasileiro”, no Brazil Institute of the Woodrow Wilson Center, em Washington D. C., nos Estados Unidos, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, falou sobre o papel e a atuação da Justiça Eleitoral, o cenário político brasileiro e o momento de crise que o país atravessa, envolvendo casos de corrupção. O ministro informou que as Eleições Municipais de 2016 tiveram em torno de 500 mil candidatos e uma arrecadação em doações declaradas que chegou a R$ 2,6 bilhões. Estiveram com o presidente do TSE no evento o ministro Teori Zavascki, que também integra a Corte Eleitoral como ministro substituto e fez palestra sobre o Poder Judiciário Brasileiro e o STF, e o secretário-geral da Presidência do TSE, Luciano Fuck.
Segundo o ministro Gilmar Mendes, houve uma redução significativa entre o que foi arrecadado em 2016 por candidatos e partidos e a eleição de 2012, que atingiu mais de R$ 6 bilhões. “Esse é um dado positivo das eleições”, disse o ministro.
“Não sei se esse modelo, que adotamos para as eleições de 2016, será replicado para as eleições de 2018, muito mais complexas, envolvendo eleições presidenciais, de governadores de estado, senadores, deputados federais e deputados estaduais. Ou seja, se poderemos prescindir dos recursos privados”, observou.
Doações de pessoas jurídicas
De acordo com o presidente do TSE, o grave problema que ocorreu no Brasil, em relação às doações de pessoas jurídicas, foi a falta de limites. “Embora a legislação promete-se uma lei para limitar os recursos, nunca houve”, informou o ministro.
Ele lembrou que uma grande empresa brasileira doou R$ 500 milhões formalmente para diversos candidatos nas eleições de 2014. “É algo extremamente significativo”, salientou.
Fundo Partidário
O ministro Gilmar Mendes disse que há um movimento no Congresso Nacional visando à elevação do Fundo Partidário, “que é recurso puramente público, dinheiro do contribuinte”.
“Inicialmente este número estava em R$ 250 milhões. Depois da decisão do Supremo, este número já subiu para quase R$ 1 bilhão. Já há propostas no sentido de se fazer uma dotação especial para campanhas eleitorais, que se avizinham, de R$ 5 bilhões, no Fundo Partidário. Em suma, é o velho debate no Brasil sobre a possibilidade ou não de se ter um financiamento. Entre nós, diga-se de passagem, o modelo já tem muitos subsídios: tem o Fundo Partidário, tem a questão do horário de TV, que também é subsidiado pelo poder público”, salientou.
Sistema eleitoral e reforma
Para o ministro Gilmar Mendes, é preciso discutir também o sistema eleitoral que desejamos. “E, claro, aqui o carro está na frente dos bois: porque estamos discutindo financiamento sem saber qual vai ser o modelo eleitoral”.
Após citar alguns modelos eleitorais possíveis, o ministro afirmou que é preciso produzir um consenso em um Congresso Nacional que tem hoje 28 partidos representados. “Por isso, na reforma aparece a discussão sobre a necessidade de suprimir a coligação nas eleições proporcionais. A ideia de uma cláusula de barreira. Isso está presente inclusive em uma proposta de reforma que tramita no Congresso. Portanto, nós temos esse dilema”, declarou Gilmar Mendes, reforçando a necessidade prévia de se debater o modelo eleitoral.
“Não é fácil encontrar uma fórmula para resolver a questão da doação ou do subsídio, do financiamento, apenas com recursos públicos”, ressaltou o presidente da Corte Eleitoral, lembrando que o Congresso já começa a se reunir para discutir essa reforma.
“A grande dificuldade que nós temos tido até aqui, em fazer reforma, tem a ver, em parte, com a própria resistência dos grupos que são os beneficiados do modelo que aí está, de repente, inclusive dos pequenos partidos, que se beneficiam das negociações, que recebem recursos nessas negociações para fazer as campanhas eleitorais, e tudo o mais”, disse Gilmar Mendes.
Na palestra, o ministro declarou que a Justiça Eleitoral, na medida do possível, está também “verbalizando” que a reforma é imprescindível. Neste ponto, para destacar a necessidade da reforma, ele mencionou a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime), que tramita no TSE contra a chapa Dilma Rousseff e Michel Temer, eleita à Presidência da República em 2014, referente a doações recebidas e despesas de campanha.
Limitação de gastos
Segundo o presidente do TSE, foram dados passos interessantes nas eleições de 2016 no sentido da limitação de gastos. “Temos que manter essa filosofia. Mas é imprescindível a feitura de uma reforma política que dê também maior densidade ao processo decisório”, disse ele.
Biometria
Gilmar Mendes informou que a Justiça Eleitoral está engajada na conclusão do processo de identificação biométrica dos eleitores pelas digitais. “Temos já mais de um terço da população eleitoral cadastrada [46 milhões]. E devemos chegar, espero até 2018, ao fim desse trabalho, dando, portanto, maior clareza, maior higidez e maior transparência a todo esse processo”, comunicou o magistrado.
O ministro destacou um dado: “No Brasil se falou muito em abstenção, algo em torno de 20%, principalmente no segundo turno, e nós verificamos, aqui da base da Justiça Eleitoral, que naqueles locais onde tivemos uma biometrização efetiva, portanto, um cadastro novo, esse índice cai para 11%”, declarou o ministro. Ele acrescentou que parte dessa chamada abstenção tem a ver com a falta de atualização, pelo eleitor, dos dados do cadastro eleitoral (pessoas que mudaram de domicílio, até falecimentos). Para as eleições de 2016, o cadastro eleitoral fechou no início de maio.
Voto facultativo
Ao final da palestra no Woodrow Wilson Center, o ministro Gilmar Mendes falou sobre uma eventual proposta de transformar o voto no Brasil, hoje obrigatório, em facultativo. “O Chile acaba de realizar essa reforma e colheu um resultado preocupante. Nas últimas eleições municipais, houve uma abstenção no Chile de 65%. O que é altamente deslegitimador do processo eleitoral. E isto é motivo para a nossa reflexão”.
Gilmar Mendes disse que, desde logo, no TSE “nós temos sido contra à ideia de voto facultativo”. “Já entendemos que é suficiente o modelo bastante liberal. Nós cobramos multa de R$ 3,00 [do eleitor que não foi votar]. Permitimos a justificação [de ausência à urna] sem maiores exigências burocráticas. Portanto, não há ônus nem justificativa para que o eleitor deixe de comparecer às eleições”.
Eventos
No domingo (6), os representantes do TSE participaram da cerimônia de abertura do Programa de Eleições dos Estados Unidos (USEP) e da 7ª Conferência da Organização Global de Eleições (GEO-7). O evento, que conta com 85 delegações e 500 membros, é patrocinado pelas empresas Smartmatic, Google, Facebook e Taiwan Elections Fundation.