Com a presença de sindicalistas nas galerias do plenário, a Câmara dos Deputados deve começar a votar na tarde desta terça-feira (5) as duas medidas provisórias que restringem o acesso dos trabalhadores a uma série de benefícios trabalhistas e previdenciários, as chamadas MPs do ajuste fiscal.
Apontadas pelo Palácio do Planalto como indispensáveis para reequilibrar a economia, as propostas dividem o Congresso Nacional e geram indignação no meio sindical.
Pronta para ser analisada pelo plenário da Câmara, a MP 665 deve ser a primeira a ser colocada em votação nesta terça. O texto, aprovado na última quarta-feira (29) na comissão especial, torna mais rigorosas as regras para obtenção do seguro-desemprego.
A MP 664, que altera as regras para a concessão de pensão por morte, será votada na comissão especial criada para analisar o assunto, às 14h30. Se aprovada, poderá ser submetida ainda nesta terça ao plenário principal da Câmara.
A estimativa do governo é que as duas medidas provisórias juntas garantam, ao longo de um ano, uma economia de R$ 18 bilhões aos cofres da União. Para tentar assegurar a aprovação dos dois textos, o autor das propostas, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, entrou em campo para ajudar na articulação política.
Depois de se reunir várias vezes com parlamentares para explicar o impacto das medidas e a importância da aprovação para recolocar o país no caminho do crescimento, Levy fará um último apelo nesta terça-feira. O ministro almoçará nesta terça com integrantes da Frente Parlamentar Agropecuária, composta por cerca de 150 deputados.
“Levy vai almoçar conosco e, certamente, tentará nos convencer a votar a favor das medidas provisórias”, disse o deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), um dos vice-líderes tucanos e integrante da bancada ruralista.
SINDICALISTAS
Além das articulações políticas para tentar aprovar as MPs na Câmara, o governo federal terá de enfrentar a pressão dos sindicatos.
Depois de barrar a entrada de sindicalistas no prédio do Legislativo durante a votação do projeto de lei que regulamenta a terceirização, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), adiantou que autorizará o ingresso dos representantes das centrais sindicais nas galerias do plenário na apreciação das MPs 664 e 665.
Em nota, a Força Sindical anunciou que cerca de 200 sindicalistas irão ao parlamento nesta terça fazer pressão pela derrubada das propostas.
“Vou colocar um número de capacidade e distribuir as senhas por partidos, de acordo com tamanho das bancadas. No caso da terceirização, o clima era de agressão. Por isso, proibi a entrada”, justificou Cunha.
OPOSIÇÃO
Contrários às MPs, líderes de partidos da oposição afirmaram ao G1 que vão utilizar instrumentos previstos no regimento interno da Câmara para postergar, ao máximo, a votação das medidas provisórias do ajuste fiscal.
DEM, PSDB e SD argumentam que o governo prejudica os trabalhadores com as medidas provisórias, ao mesmo tempo em que não demonstra a intenção de cortar os gastos da máquina pública.
“O que a presidente Dilma chama de ajuste fiscal nada mais é que transferência das dificuldades para o trabalhador e para o empresariado. Você não vê, por parte do governo, gesto no sentido de conter despesas, sobretudo, de custeio. O número de ministérios é exorbitante”, disse o líder do SD na Câmara, deputado Arthur de Oliveira Maia (BA).
O líder do DEM, Mendonça Filho (PE), afirmou que ele orientará sua bancada a votar pela derrubada total das medidas provisórias.
“Minha orientação é contrária às medidas provisórias [do ajuste fiscal]. A conta está sendo repassada ao trabalhador, à classe média e ao setor produtivo, com aumento de impostos e retirada de direitos para os trabalhadores. A orientação é rechaçar todo o pacote de maldades”, disse Mendonça Filho.
Principal partido da oposição, o PSDB também deverá obstruir e votar contra as medidas provisórias, informou Nilson Leitão.
“A nossa posição é contrária a essa votação. Se tiver atropelo do governo, vamos tentar partir para a obstrução. Se o governo quer cortar a carne alheia, que demonstre que vai cortar a sua primeiro. Não reduz contas, não reduz gastos, e quer onerar o trabalhador?”, criticou.
BLOQUEIO DO ORÇAMENTO
Nesta segunda-feira (4), o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), reuniu líderes da base aliada para defender as duas MPs do ajuste fiscal. Após o encontro, Temer alertou que o corte no Orçamento de 2015 será “muito radical” se as medidas não forem aprovadas pelos congressistas.
O bloqueio no Orçamento, tecnicamente denominado “contingenciamento”, consiste em retardar ou “inexecutar” parte da programação de despesas prevista na lei orçamentária em função da insuficiência de receitas. “Se não houver ajuste, o contingenciamento será muito radical. Se houver ajuste, o contingenciamento será muito menor”, advertiu Temer.
Apesar da divisão interna, o líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), prometeu que seu partido irá votar pela aprovação das medidas provisórias. Parte da bancada petista havia manifestado resistência aos textos nas últimas semanas por considerar que as medidas representariam prejuízos ao trabalhador.
O que a presidente Dilma chama de ajuste fiscal nada mais é que transferência das dificuldades para o trabalhador e para o empresariado. Você não vê, por parte do governo, gesto no sentido de conter despesas, sobretudo, de custeio. O número de ministérios é exorbitante.”
O ministro da Secretaria de Aviação Civil, Eliseu Padilha, um dos seis nomes do PMDB no primeiro escalão, admitiu que pode haver “dissidências” dentro de seu partido na votação do ajuste fiscal.
Um dos principais conselheiros políticos do vice-presidente da República, Padilha disse ter “convicção” de que o PT “fechará a bancada” em favor do ajuste, assegurando os votos dos 70 deputados da legenda.
“Nós temos essa convicção de que o PT vai acabar dando a bancada fechada para o ajuste. E o PMDB trabalha com a possibilidade de estar muito próximo da totalidade. Teremos defecções, até porque o PMDB é um partido que sempre tem defecções, e teremos dissidências, mas trabalhamos com a probabilidade de termos dos [votos dos] 67 [deputados], algo entre 50 e 55 [votos favoráveis ao ajuste]”, comentou o titular da Aviação Civil.
ALTERAÇÕES NAS MPs
Para viabilizar acordos com o PT e outros partidos da base governista, o Palácio do Planalto aceitou ceder em alguns pontos das duas medidas provisórias. O relatório final da MP 665, aprovado na semana passada pela comissão especial, determina que o trabalhador terá direito ao seguro-desemprego se tiver trabalhado, ao menos, 12 meses nos últimos dois anos.
O prazo inicial proposto pelo governo era de 18 meses. Antes da medida provisória, o trabalhador precisava de apenas seis meses para solicitar o benefício. Para reivindicar o seguro-desemprego pela segunda vez, o relatório estipula que o trabalhador tenha nove meses de atividade.
Antes, o prazo exigido era de seis meses de trabalho, e o governo queria ampliar para 12 meses. O relatório final, entretanto, mantém o prazo de seis meses previsto originalmente pela MP se o trabalhador requisitar o benefício pela terceira vez.
Em relação ao abono salarial, o texto aprovado na comissão determina que o trabalhador que recebe até dois salários mínimos deverá ter trabalhado por três meses para ter direito ao benefício. O texto do Executivo exigia seis meses. Na regra anterior, o prazo era de um mês.
O deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator da MP 664, também fez alterações no texto para flexibilizar, na comparação com o texto do Executivo, as regras de acesso à pensão por morte. O texto será votado na comissão especial que analisa a matéria às 14h30 desta terça.
O relatório do petista diminui o tempo de contribuição exigido na MP para que o cônjuge possa obter pensão por morte e derruba o artigo que reduzia o valor do benefício para 50% mais 10% por dependente.
Com a alteração na MP feita por Zarattini, o cônjuge poderá requerer o benefício se o tempo de união estável ou casamento for de mais de dois anos e o segurado tiver contribuído por um ano e meio. Para a concessão do benefício, o texto original do governo previa dois anos de união e dois anos de contribuição.
Quando o tempo de casamento ou de contribuição forem inferiores ao necessário para se ter o benefício, o cônjuge terá ainda assim direito a uma pensão, mas somente durante quatro meses. O texto original não previa a concessão desse benefício temporário.
Zarattini também derrubou o texto do Executivo no trecho que reduzia o valor da pensão ao cônjuge – antes integral – para 50% do valor mais 10% por dependente. Pelo relatório do petista, o valor volta a ser de 100%.
Ele também alterou a tabela de duração das pensões aos cônjuges, fixando como base a idade, e não a expectativa de vida, da seguinte forma:
– 3 anos de pensão para cônjuges com menos de 21 anos de idade
– 6 anos de pensão para cônjuge com idade entre 21 e 26 anos
– 10 anos de pensão para cônjuge com idade e entre 27 e 29 anos
– 15 anos de pensão para cônjuge com idade entre 30 e 40 anos
– 20 anos de pensão para cônjuge entre 41 e 43 anos
– Pensão vitalícia para cônjuge com mais de 44 anos