PF e CGU investigam o envolvimento de 20 prefeituras do Ceará numa fraude milionária aplicada com empresas
A Polícia Federal no Ceará, em conjunto com o Ministério Público Federal (MPF), Justiça Federal e a Controladoria Geral da União (CGU), desencadeou, ontem, uma operação batizada de ´Cactus´, com o objetivo de recolher provas documentais e técnicas que apontam a ação de uma organização criminosa neste Estado responsável pelo desvio de verbas federais destinadas a obras de combate aos efeitos da seca. Em quatro anos, a quadrilha teria se apoderado de milhões de reais através de fraudes em licitações em, pelo menos, 20 Municípios.
Na tarde de ontem, representantes da Polícia Federal e da Controladoria Geral da União (CGU) deram detalhes da investigação que comprovou a fraude milionária com verbas federais FOTO: KLÉBER GONÇALVES
A operação cumpriu 62 mandados de busca e apreensão em todos os 20 Municípios cearenses investigados e também em Goiás, Rio Grande do Norte e Brasília. Ninguém foi preso, mas as autoridades revelaram que as fraudes praticadas pela organização mafiosa desviaram uma grande soma do total de R$ 48 milhões que o Governo Federal liberou, desde 2008, para os cofres de 20 prefeituras cearenses.
Na tarde de ontem, numa entrevista coletiva na sede da PF, nesta Capital, a delegada federal Cláudia Braga, titular da Delegacia de Crimes Financeiros e de Desvio de Recursos Públicos (Delefin); e os representantes da CGU, Israel Carvalho e Luiz Fernando Menescal; além do novo superintendente da PF no Ceará, delegado Renato Casarini Muzy, falaram das investigações em torno do caso.
Buscas
Em prédios das prefeituras, na residência das pessoas investigadas e nas sedes de diversas empresas, como construtoras, empreiteiras e de assessoria técnica, foram apreendidos computadores, notas fiscais, notas de empenho, livros contábeis e todo o restante de uma papelada que agora serão analisados através de exames periciais e pelos agentes da Delefin.
“Com esse material, vamos chegar aos responsáveis pela fraude nas licitações. O que a Polícia busca neste momento são indícios”, explicou a delegada Cláudia Braga. Ela informou que todos os 62 mandados de busca e apreensão, expedidos pela 11ª Vara da Justiça Federal no Ceará, foram cumpridos por uma força-tarefa da PF que mobilizou, nada menos, que 288 agentes, peritos e delegados, com o apoio de 12 auditores da CGU nos três Estados e, ainda, no Distrito Federal. Embora as investigações estejam sob ´segredo de Justiça´, as autoridades informaram que 50 entes, entre pessoas físicas e jurídicas, estão na mira da apuração. “A operação foi só um desdobramento”, avisou Cláudia Braga.
FERNANDO RIBEIRO
EDITOR DE POLÍCIA
NÚMERO
48 milhões de reais foi o total de verbas que o Governo Federal repassou a 20 prefeituras do Ceará para obras. Parte desse dinheiro acabou sendo desviada
Prisão dos envolvidos no golpe é “questão de tempo”
Embora não tenham revelado nomes de pessoas nem de empresas, as autoridades que participam das investigações em torno do desvio milionário de verbas de combate à seca informam que o indiciamento em inquérito e a prisão dos responsáveis pelo golpe “é questão de tempo”.
Conforme a delegada Cláudia Braga, as investigações – iniciadas em 2008 – apontam que as verbas federais, liberadas através de ministérios como o da Integração, da Saúde, e do Turismo, e intermediadas pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs), eram direcionadas pela organização criminosa para as prefeituras, a quem cabia organizar os processos licitatórios para a construção das obras de combate aos efeitos da estiagem, como açudes, barragens, poços e outros.
´Laranjas´ e fantasmas
“Constatou-se que os grupos beneficiados ou que participavam das licitações e venciam os certames eram sempre os mesmos. Agora, estamos na fase de identificação das empresas que existem e das ´fantasmas´ que atuaram dentro da organização criminosa, inclusive, com a participação de ´laranjas´”, afirma a delegada. Ainda, de acordo com os representantes da CGU, a ação criminosa tinha origem a partir da ação de lobistas em Brasília e terminava com o desvio do dinheiro público através das fraudes nas licitações.
“A operação de hoje não representou o término da investigação. Pelo contrário, ela pode ser o início de uma nova etapa do trabalho”, advertiu a delegada federal Cláudia Braga.
Prefeituras
De acordo com a PF, estão sendo investigadas as prefeituras dos seguintes Municípios cearenses, Aiuaba, Apuiarés, Barbalha, Canindé, Catarina, Fortaleza, Guaraciaba do Norte, Iguatu, Irauçuba, Itapipoca, Itapiúna, Juazeiro do Norte, Morada Nova, Mucambo, Quixeramobim, Reriutaba, Saboeiro, Tarrafas, Tejuçuoca e Ubajara.
Na manhã de ontem, as sedes de todas as 20 prefeituras, assim como residências e empresas de diversos gestores e ex-gestores, e de empresários, foram devassadas pelos agentes federais.
Casa do ex-diretor é cercada pela PF
Um dos ´alvos´ da ´Operação Cactus´, na manhã de ontem, foi a residência do ex-diretor geral do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs), engenheiro Elias Fernandes Neto em Natal (RN).
O engenheiro Elias Fernandes Neto, ex-diretor geral do Dnocs, não foi indiciado no inquérito, mas está sendo investigado pela Polícia Federal e CGU FOTO: KID JÚNIOR
Segundo as autoridades, oficialmente, Elias Neto, que pediu demissão do cargo no ano passado, não pode ser considerado suspeito do caso, mas em sua casa a Polícia apreendeu uma vasta documentação e computadores que deverão agora ser analisados no decorrer desta nova etapa da investigação.
“Entreguei todo o material que eles pediram, sem nenhum problema”, resumiu o ex-diretor daquela instituição, que foi surpreendido no começo da manhã quando a residência foi cercada pelos agentes federais.
Conluio
Conforme as investigações, empresas ´fantasmas´ e outras legais teriam entrado em conluio com as prefeituras investigadas, para que as licitações fossem direcionadas. Os vencedores era sempre quem faziam parte da organização criminosa montada em 2008 e que agiu até 2013.
Outro ´alvo´ da operação foi a própria sede do Dnocs, nesta Capital. Era por volta de 6 horas quando os agentes federais chegaram ao prédio da instituição e subiram até os andares superiores do edifício, na Avenida Duque de Caxias, onde estão instalados os gabinetes da diretoria.
Os policiais agiram rapidamente e pegaram de surpresa os servidores que chegavam para dar início ao expediente. “Não deu tempo nem de a gente saber o que estava acontecendo, tivemos que entregar tudo”, contou um dos funcionários.
Crimes
Mas, segundo as autoridades que concederam a entrevista coletiva na sede da PF, o órgão (Dnocs) não é o foco da investigação, muito embora ali estivessem muitos documentos que podem levar ao aprofundamento da apuração e à identificação de quem participou do desvio das verbas federais. A delegada Cláudia Braga informou que já há indícios colhidos da prática de crimes como fraude em licitação (lei federal de número 866/93), falsificação de documentos e formação de quadrilha.